Azilton Viana: "Censo confirma que família contemporânea tem cada vez mais novos arranjos"

13/08/2015 | Políticas de igualdade

Azilton Viana*

O Censo de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou um dado novo que muda os parâmetros do conceito de família vigente no país. As famílias tradicionais, compostas por homem, mulher e filhos, já não eram mais a maioria nos lares brasileiros e correspondiam a 41% dos arranjos familiares no Brasil. Em números absolutos, eram 23,35 milhões de famílias. Os demais arranjos – incluindo casais homoafetivos – representavam em 2010 59% das famílias brasileiras ou 33,64 milhões de núcleos familiares.

Dentro dos novos conceitos de família, 60 mil famílias se declarou homoafetiva no censo – 53,8% delas formada por mulheres. O levantamento do IBGE também mostrou que havia no Brasil 6,95 milhões de famílias unipessoais no país. As famílias estendidas (casais com filhos e outros parentes, homens ou mulheres com filhos e outro parente e casal sem filhos e outro parente) já respondiam por 10,83 milhões de lares brasileiros. Famílias compostas com não parentes eram 1,42 milhão de pessoas. Quase 10 milhões de famílias eram formadas por mães ou pais solteiros.

Os números apurados pelo IBGE mostram ainda que a família brasileira se multiplicou, trazendo 19 laços de parentesco, contra 11 presentes no censo de 2000. Para os advogados Luciana Poli e Leonardo Poli, a criação e a definição de uma família vão muito além dos laços de sangue ou da formatação tradicional de um grupo de pessoas.

“A família deve ser encarada como a comunidade de vida material e afetiva entre seus integrantes, união de esforços para o desenvolvimento de atividades materiais e sociais, convivência que promova mútua companhia, apoio moral e psicológico, na busca do melhor desenvolvimento pessoal de seus membros. Ela é um complexo espaço relacional e afetivo, é o locus primeiro de transmissão de cultura, embora a evolução da cultura, de geração a geração, transforme e reconstrua a própria família”, afirmam, em artigo, os especialistas em família.

Pela metodologia do IBGE, a única forma não aceita de família é a de um grupo de adultos que mora no mesmo local sem laços de sangue ou relacionamentos romântico-afetivos. Nesse caso, o instituto classifica esse grupo como “moradia em conjunto”. Por outro lado, a Associação Brasileira de Terapia Familiar (Abratef) reconhece todas as formas de família como válidas. 

Em março deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) garantiu a um casal homossexual o direito de adotar. Ao negar um recurso do Ministério Público do Paraná, a ministra Cármen Lúcia defendeu que o conceito de família, envolvendo regras de visibilidade, continuidade e durabilidade, também podem ser aplicados a casais homoafetivos. 

A decisão teve como base também o reconhecimento, em 2011, da união estável entre parceiros do mesmo sexo, feita pelo ministro Ayres Britto. “A Constituição Federal não faz a menor diferenciação entre a família formalmente constituída e aquele existente aos rés dos fatos. Como também não distingue entre a família que se forma por sujeitos heteroafetivos e a que se constitui por pessoas de inclinação homoafetiva”, afirmou ele na época.

É justamente com base nos dados do IBGE e nas decisões da mais alta Corte do país que setores progressistas ligados aos movimentos sociais e à esquerda defendem um Estatuto das Famílias e não um Estatuto da Família, conforme querem, por exemplo, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), relator do famigerado Estatuto da Família.

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* Azilton Viana é vice-presidente do Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (Cellos-MG) e assessor parlamentar da deputada Marília Campos

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