Bruno Boghossian: "Ideia de perseguição será a última linha de defesa de Bolsonaro"
Ideia de perseguição será a última linha de defesa de Bolsonaro
O ex-assessor parlamentar e policial reformado Fabrício José Carlos de Queiroz em foto ao lado de Jair Bolsonaro. A imagem foi publicada no perfil do instagram do ex-auxiliar em 21 de janeiro de 2013. Foto: Reprodução/Instagram
Bruno Boghossian
Folha de São Paulo, 20/06/20
Mais do que nunca, Jair Bolsonaro tenta convencer seus apoiadores de que é vítima de uma conspiração de gente poderosa. O avanço do Supremo sobre seus aliados e a prisão de Fabrício Queiroz reduziram as linhas de defesa do presidente. O cerco se ampliou tanto que restou apenas a ideia de perseguição.
Bolsonaro quer vender a impressão de que suas derrotas no Congresso não têm relação com a incompetência do Planalto e de que a interferência na PF foi só uma maneira de conter injustiças contra sua família. As mortes na pandemia seriam uma fraude grosseira e o foguetório lançado por seus aliados sobre o STF deve ter sido uma ilusão de ótica.
O presidente, que nunca aceitou a limitação de seus poderes, explora o próprio fracasso. Sem apoio consistente na Câmara, o governo faz propaganda de uma suposta conspiração engendrada por atores políticos.
Quando a equipe econômica se mostrou incapaz de negociar a aprovação de um projeto de socorro aos estados durante a pandemia, Bolsonaro acusou Rodrigo Maia de “quase conspirar por aí contra o governo”.A manipulação primitiva até rende alguns dividendos. A agitação criada pelo presidente costuma energizar sua base nas redes sociais e também ajuda a reagrupar setores hesitantes dentro do próprio governo.
Os integrantes mais desconfiados da ala militar, em especial, acompanham Bolsonaro na percepção de que o Legislativo e o Judiciário cerceiam deliberadamente o Planalto. O grupo verde-oliva, por isso, ainda é um relevante aliado do presidente em seu tenso embate com o STF.
Ao ver a prisão de um homem de confiança da família, Bolsonaro tentou replicar a fórmula. O presidente reclamou da “prisão espetaculosa”, e seu filho Flávio disse que o objetivo da ação era atingir o governo.
Dessa vez, a missão é mais difícil. O reaparecimento de Queiroz pode até representar uma ameaça ao Planalto, mas o ex-assessor é um problema particular do clã Bolsonaro. O instinto de proteção coletiva, nesse caso, tende a ser muito mais restrito.
Bruno Boghossian é jornalista e mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).