Carta Capital: “Nordeste sente os benefícios da responsabilidade fiscal”
Vitorino, secretário da Fazenda da Bahia. Estado busca melhorar a gestão
Carta Capital – 04/11/2017
Os estados do Nordeste sentem a crise econômica, mas estão mais preparados do que os demais para lidar com a conjuntura. Um estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro aponta que o baixo nível de investimentos é um desafio para a recuperação da economia e, consequentemente, da própria arrecadação de tributos.
Apenas três estados investiram mais de 10% da Receita Corrente Líquida em 2016: Ceará, Piauí e Bahia. Entre os dez que apresentaram os maiores índices de investimento, ainda figuram Paraíba, Alagoas e Maranhão.
A se considerar a posição relativa de cada unidade da federação em quatro indicadores analisados (dívida, gasto com pessoal, disponibilidade de caixa e investimentos), o estudo aponta que Ceará, Maranhão, Alagoas e Paraíba estão entre os dez em melhor situação, posição inversa à de Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Eleito o estado com a melhor situação fiscal pela Firjan, o Ceará investiu o equivalente a 11,1% da receita corrente líquida no ano passado. No início de 2015, no curso de Economia da Universidade Federal do Ceará, no qual é professor, Mauro Benevides Filho, secretário da Fazenda há 11 anos, estimava com seus alunos de doutorado que o País ia sofrer queda do PIB por dois anos consecutivos e estava à beira de uma crise fiscal que perduraria por alguns anos, com efeitos sobre o caixa da União, de estados e municípios.
O ajuste fiscal foi feito logo no primeiro ano de mandato do governo eleito no fim de 2014. Foram reduzidos 410 milhões em custeio, com cortes de aluguel de carros e economia de água e energia, além da revisão de contratos. “Tivemos de reduzir as despesas para compensar a queda de arrecadação”, explica Benevides Filho.
Desde 2007 ocorrem mudanças na gestão. A discussão do custeio da máquina pública é feita em um comitê que reúne os secretários, a controladoria e a procuradoria estaduais. “Os secretários não discutem custeio com o governador, discutem políticas de governo”, destaca. Neste momento, na contramão do resto do Brasil, o Ceará contrata 4,2 mil policiais militares e 700 escrivães, agentes penitenciários e de trânsito. “O ajuste fiscal não é um fim em si mesmo, ele tem de dotar o Estado para investir mais”, diz o secretário.
O Ceará aguarda a liberação de uma linha de crédito de 1 bilhão de reais do Banco do Brasil, destinada a obras nas áreas de transporte público, saúde e educação, e analisa um pacote de concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs).
O centro de eventos deverá ter sua operação concedida a uma empresa particular. O Porto de Roterdã, na Holanda, discute tornar-se minoritário na Ceará Portos, empresa superavitária que administra Pecém. O Veículo Leve sobre Trilhos, em construção em Fortaleza, pode ter sua gestão também repassada à iniciativa privada. “A questão é como melhorar a gestão da máquina e manter os investimentos.”
A Bahia tem adotado uma série de medidas para melhorar a eficiência de sua máquina pública. A Secretaria de Fazenda criou uma área de qualidade do gasto público, acompanhando as despesas das unidades a partir do orçamento de cada órgão e secretaria. Esses números são discutidos em reuniões periódicas entre o secretário da Fazenda e os demais colegas, e depois em reunião semestral com o governador Rui Costa. A economia chega a 1,2 bilhão de reais de 2015 até junho, estima Manoel Vitorino, titular da Fazenda.
O combate à sonegação foi reforçado com o aperfeiçoamento do cruzamento de dados fiscais e o monitoramento online de fraudes. “Investimos 1 bilhão de reais no primeiro semestre, atrás apenas de São Paulo, o que tem contribuído para a economia. A melhora das contas públicas tem de combinar com investimentos, para que os efeitos da recessão não sejam ainda maiores”, aponta o secretário. Uma das principais obras é a expansão do metrô de Salvador, que acaba de totalizar 29 quilômetros de extensão.
Em Pernambuco, a receita não foi diferente. Para aumentar a receita, o governo lançou um pacote tributário anticrise, com várias medidas, entre elas as mudanças no Imposto sobre Causa Mortis e Doação, cujas alíquotas variavam entre 2% e 5%. A faixa de isenção do tributo passou de 5 mil para 50 mil reais, enquanto bens acima de 400 mil reais passaram a ser tributados pela alíquota máxima de 8%.
O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) teve sua alíquota mais alta, de 6%, voltada para os carros de maior valor, destaca Edilberto Xavier, coordenador de Controle do Tesouro Estadual da Secretaria da Fazenda do Estado de Pernambuco. Criou-se ainda o fundo estadual de equilíbrio fiscal, financiado com a redução dos benefícios em 10% de toda a parte isenta do ICMS, diminuindo os incentivos fiscais concedidos às empresas.
Foi instituído ainda um grupo técnico para análise prévia e aprovação de novas despesas e desenvolvido um plano de monitoramento de gastos, com reuniões quinzenais, com foco na redução de gastos de cada secretaria de estado.
A iniciativa privada tem sido essencial na expansão dos investimentos. No Maranhão, uma PPP prevê a construção de quatro presídios que poderão somar 150 milhões de reais em investimentos e a abertura de 2 mil vagas. Os estudos das duas consultorias que se habilitaram a analisar a viabilidade do empreendimento foram entregues ao governo.
Um desses estudos será aprovado e deverá embasar o lançamento do edital, previsto para o fim do ano. A ideia é de que os presídios comecem a operar até junho de 2019. “Além de não ter aporte inicial do governo em um momento de aperto fiscal, essa ideia pode ter retornos sociais, com o contrato tendo metas e objetivos que podem ser mais bem apurados”, destaca Murilo Andrade de Oliveira, secretário da Administração Penitenciária.
No início de agosto, o governo do Piauí lançou a primeira PPP do País com o objetivo de melhorar a qualidade da conexão à internet. Além de se encarregar da gestão e prestação de serviços, o parceiro privado terá de investir 250 milhões de reais na instalação de 1,5 mil pontos de acesso e instalação de fibra óptica, do litoral ao extremo sul, o que beneficiará 2,1 milhões de piauienses.
Uma parte dos recursos dados como garantia equivale a um quarto dos 8% que o estado recebe do Fundo de Participação, uma modalidade de transferência de recursos financeiros da União para os estados e municípios, prevista no artigo 159 da Constituição Federal.