Emir Sader: “A polarização entre petistas e tucanos é positiva”
Brasil 247 – 28/03/2017
Passou a ser moda fazer a crítica do Fla x Flu que seria a polarização entre PT e PSDB. Marina Silva, na tentativa de projetar uma "terceira via", teve esse como um dos seus temas, mas ao ter como guru um economista tucano e ao aderir a Aécio no segundo turno, só reafirmou aquela polarização. Outros abordam, de maneira vulgar, a necessidade de superar essa polarização, como se ela fosse artificial.
Na Europa, conforme os dois partidos tradicionais aderiram à política de austeridade – a forma do ajuste fiscal neoliberal por lá –, a polarização entre social democracia e conservadores perdeu validade. Nenhum dos dois era anti-neoliberal. Surgiram então alternativas ao bipartidismo, na extrema direita e na esquerda.
Aqui a divisão entre PT e tucanos tem sentido, porque os tucanos representam o modelo neoliberal no governo de FHC, enquanto o PT representa o antineoliberalismo, nos governos Lula e Dilma. Porque esta linha divisória continua sendo a determinante no período histórico atual, em que o capitalismo vestiu o traje neoliberal.
As campanhas eleitorais desde então foram muito esclarecedoras, com o PT defendendo o modelo de desenvolvimento econômico com distribuição de renda e o PSDB defendendo a retomada do modelo do governo de FHC, de centralidade do ajuste fiscal. E o povo decidiu, quatro vezes seguidas, pela proposta do PT. A polarização foi entre o modelo neoliberal de FHC e o modelo antineoliberal do PT.
Nas eleições mais recentes, seja Marina ou até mesmo o candidato tucano, tentaram disfarçar a prioridade do ajuste fiscal nas suas propostas, dizendo que manteriam as políticas sociais dos governos do PT. Mas seus gurus econômicos, paralelamente, reafirmavam os princípios neoliberais do ajuste fiscal, revelando como as políticas sociais seriam vítimas dos projetos dos seus candidatos.
Marina, em particular – mas outros políticos também – afirma que é necessário romper a polarização entre PT e PSDB, que seria negativa, que estreitaria as possibilidades e aponta para uma "terceira via". Esta ficou conhecida na Europa como uma renovação do neoliberalismo, sob o lema de "nem Estado, nem mercado" ou de "nem tanto Estado, nem tanto mercado". Foi protagonizada por Tony Blair, por Bill Clinton. Escamoteou a polarização entre neoliberalismo e antineoliberalismo, representando uma continuidade daquele, sob outra forma.
A melhor polarização é em torno do neoliberalismo, modelo assumido pelo capitalismo no período histórico atual, porque é o tema central do nosso tempo. Marina tenta disfarçar isso, o PMDB esteve de um lado, agora está do outro. Mas a linha divisória é essa: a favor ou contra o modelo neoliberal.
Quando se tenta desclassificar a polarização falando do Fla x Flu, se quer dizer que se trataria de alinhamentos irracionais, sectários, futebolísticos, quando se trata de alinhamentos racionais, a favor ou contra o neoliberalismo. A direita tentar impor a favor ou contra a Lava Jato, a favor ou contra a corrupção, a favor ou contra o voto em lista, a favor ou contra o foro privilegiado. Fugindo do tema essencial: o neoliberalismo.