Hoje em Dia: “Mil nascentes: atípicos na área urbana, mananciais estão por toda parte em BH”
Jornal Hoje em Dia – 24/10/2017
Em parques, dentro de uma escola ou mesmo em um terreno particular. Em BH, as nascentes estão por todo lado. Um tesouro minando por mais de mil pontos na cidade. As fontes d’água foram catalogadas por equipe da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA), que há 16 anos realizada este trabalho.
“As pessoas veem os pontos, ou em casa ou em outras áreas, e comunicam. A equipe vai ao local e faz uma vistoria para constatar se é mesmo um ponto de fonte de água ou não”, explica Rodrigo Adamo, geógrafo da Prefeitura de Belo Horizonte.
Atípicas na área urbana, as nascentes encontradas na capital estão em locais comuns, como as 76 áreas de preservação permanente, ou inusitados, como abaixo de grandes construções e residências. Conforme o estudo da SMMA, a maioria das fontes d’água estão em áreas privadas, ou seja, casas ou empresas.
Registro
A preservação é o objetivo principal do levantamento. Depois da vistoria, as nascentes encontradas vão para um banco de dados. O registro tem todas as características da fonte, como: localização, qualidade da água, condições do entorno e relação com a comunidade. A partir da consolidação dessas informações, serão criados programas de proteção e educação ambiental, de acordo com a SMMA.
Além da quantidade de nascentes, a qualidade da água também impressiona. Quase todos os pontos estão com a mina limpa. O que não quer dizer que o líquido que nasce ali seja próprio para consumo.
“Água limpa não é potável. Quem determina se o líquido é adequado para ingestão são órgãos do governo federal especializados nisso. As nascentes não têm esgoto ou lixo visível. Esse é o critério principal para determinar a qualidade”, explica Rodrigo Adamo.
A seca também chama atenção. Como todas as nascentes da capital são consideradas de baixa magnitude, segundo níveis de avaliação do estudo, no período de seca, a água desaparece.
Preservação longe da fonte é desafio, dizem ambientalistas
Diferentemente das nascentes em Belo Horizonte, que são visitadas pela equipe da Secretaria de Meio Ambiente, cursos d’água têm a medição feita por distância. A capital tem mil quilômetros de rios, córregos, ribeirões e outros.
Mas, ao contrário da água limpa das fontes, grande parte dos cursos d’água está poluída. “Por causa da urbanização, eles estão em péssimas condições. O esgoto está entre os principais poluentes. Alguns domicílios que não têm interceptação acabam jogando diretamente nos rios os dejetos”, explica o especialista em recursos hídricos, Milo Nascimento.
Cuidar das nascentes, conforme o especialista, é importante, já que elas garantem o aporte das cabeceiras, mas não há como esquecer da recuperação desses cursos d’água.
“É mais difícil despoluir do que preservar. Porém, se não houver um conjunto de ações, não funciona”, explica Milo Nascimento, que sugere a recuperação das matas ciliares e o trabalho de impermeabilização do solo como opções para o restabelecimento da área hídrica.
Abandono
No Parque do Planalto, área de preservação permanente de BH localizada na região Norte, existem duas fontes mapeadas. O local está mal cuidado, com lixo em vários pontos, inclusive na nascente. Onde deveria passar o curso d’água, caixas vazias de cigarro e até um sapato.
Segundo o presidente Fundação de Parques Municipais e Zoobotânica da PBH, Sérgio Augusto Domingues, um mutirão está programado para a próxima semana para o parque.
“Já fizemos um outro, há cerca de seis meses, para tirá-lo do abandono. Agora vamos realizar uma inspeção junto à Secretaria de Obras, para pensar em intervenções”, explicou.
No Ribeiro de Abreu, também na região Norte, a situação é diferente. Espelho d’água limpo, peixes e até um deck. Depois de um trabalho de conscientização feito pela comunidade, o local virou ponto turístico.
“É comum ver pessoas por aqui, curtindo a paisagem e observando a nascente. Hoje, há um pouco mais de noção da importância desses pontos”, comenta a colaboradora do Conselho Comunitário Unidos pelo Ribeiro de Abreu, Cléria Rocha Matias.
Nas escolas, a presença de nascentes é gancho para educação ambiental. No bairro Santa Efigênia, região Centro-Sul da capital, são 11 nascentes.
Os pontos viraram atração entre os alunos que, engajados, sabem tudo sobre preservação. “Em tempos de escassez, tudo que devemos fazer é usar bem o recurso que está disponível. Passamos isso para as crianças de forma lúdica e clara para que eles deem continuidade a essa preservação”, explica Leda Ávila, vice-diretora da escola.
O espaço virou sala de aula provisória e é cobiçada pelos alunos. “Isso demonstra a necessidade de conscientização, principalmente, de quem convive com as nascentes”, observa Rodrigo Adamo, geógrafo da PBH.
Preservação
As pessoas que têm em empresas ou casas uma fonte de água desse tipo, precisam seguir as recomendações do Código Florestal. Ele determina, dentre outras questões, a vedação de construir em trecho próximo à nascente e de manter a vegetação nativa ou fazer o plantio de uma vegetação que auxilie o fluxo de água.
Para o aposentado Itamar Santos, que tem água limpa brotando de uma cisterna, o quintal de casa virou um oásis. Plantas, peixes e uma contenção são ações feitas pelo morador para preservar a fonte.
Uma caixa reservatório foi feita para armazenar a água que jorra diariamente e uma bomba ajuda o idoso a levar para a casa o líquido usado para tarefas domésticas. Animais, cadeira de descanso e uma vara de pescar completam a área de lazer no entorno da nascente. “Muita gente tem inveja disso aqui”, brinca Itamar.
Quando comprou o lote, ele já sabia da nascente. “Na época, ninguém dava muita importância para isso. Não teve nenhuma influência no valor da casa, por exemplo”, explica.
Com a estiagem, o local também está com um fluxo menor de água, mas mesmo assim é o suficiente para lavar as roupas, a louça e as áreas externas da residência. “Estou sempre pesquisando e consultando algumas pessoas para saber como eu posso preservar ainda mais a nascente”, conta.