
Jornal O Tempo: “Justiça manda matricular 108 alunos em Umeis em dois meses”
Jhonny Cazetta
Jornal O Tempo – 22/03/2016
A Prefeitura de Belo Horizonte teve que matricular “à força” 108 crianças em Unidades Municipais de Educação Infantil (Umeis) no primeiro bimestre deste ano. Em média, foram quase dois novos alunos que chegaram por dia ao sistema devido a mandados de segurança expedidos pela Justiça nesse período. Destinado prioritariamente a famílias em situação de vulnerabilidades social e financeira, o modelo é muito procurado pela classe média, que se baseia na Constituição para ter direito à educação.
“Praticamente todo dia chega uma ação diferente. A educação é um direito de todos, independentemente da renda financeira. É um dever do Estado suprir essa necessidade e tentar o mais rápido possível ampliar o atendimento”, afirmou o juiz titular da Vara da Infância e Juventude, Marcos Padúla.
Como consequência das decisões judiciais, a superlotação das Umeis, que recebem crianças de 0 a 5 anos, é evidente e reconhecida pela própria prefeitura. Espaços voltados para o lazer e atividades diversas estão sendo adaptados como salas de aula, pois algumas delas já estão com limite máximo de alunos. “Essa é uma realidade que infelizmente estamos enfrentando. Em algumas unidades, por exemplo, a sala multiúso, que é o espaço em que temos a biblioteca e a sala de vídeo, está comprometida para dar lugar a esses alunos que vêm de mandados judiciais”, admitiu a gerente de Coordenação da Educação Infantil da prefeitura, Mayrce Freitas.
Para ela, se mais alunos continuarem chegando por força judicial, as Umeis correm risco de perder a qualidade de ensino. “Com esses mandados, nós podemos deixar de ser referência, pois a qualidade será comprometida. É isso que os pais têm que entender. Ele está conseguindo a vaga na Justiça? Está. Mas ele está comprometendo o atendimento da criança dele e das demais que já estão matriculadas”, disse.
Busca. Há dois meses, uma dentista procura vaga para sua filha de 2 anos em uma Umei da capital. Ela acionou a Justiça para conseguir matricular a criança e aguarda decisão sobre o pedido. “Acho que esse é um direito que eu tenho, independentemente da minha condição financeira. No ano passado, ela ficou sob os cuidados de familiares e também de uma escolinha particular. Mas, se eu posso usufruir de um bom serviço público para ela, por que eu deveria abrir mão disso? Não abro, não”, questionou. A mulher pediu que sua identidade fosse preservada.
A dificuldade enfrentada pela dentista não é novidade para outras famílias. A serviçal Maria Neide Sousa, 37, contou que esperou mais de dois anos na fila para colocar seu filho em uma Umei (veja abaixo como as vagas são distribuídas). “Ele já tem 4 anos e só agora consegui colocá-lo aqui (em uma unidade da região Centro-Sul). Não tenho dinheiro para pagar uma babá ou escola particular. E sempre questiono: se há espaço para uns, tem que haver espaço para todos”.
Permissão. Por lei, são permitidas sete crianças de até 1 ano por professor em sala. Até 2 anos, são 12 pequenos por docente. Já até os 3 anos, 16 para cada educador.
Uso da rede privada é alternativa
Além da obrigatoriedade matrículas de alunos nas Umeis, a Justiça também tem tomado decisões de fazer com que a prefeitura pague mensalidades de escolas particulares para aqueles que não conseguiram vagas no sistema público. Segundo o juiz Marcos Padúla, essa tem sido uma maneira para tentar evitar a superlotação nas Umeis, com a consequente piora no ensino. Ele não informou esse número.
“O primeiro pedido das famílias é uma vaga na Umei. Se não houver vagas na rede atual, então elas pedem condenação do município no pagamento da mensalidade em uma escola particular. E isso é o que nós temos concedido para evitar a superlotação, que, além de ser uma ilegalidade, pois há um limite máximo permitido de alunos, pode afetar também a qualidade dessas escolas”, argumentou.
Universal. De acordo com a prefeitura, o principal gargalo é a falta de vagas para crianças de 0 a 3 anos. Segundo a Secretaria Municipal de Educação, alunos de 4 e 5 anos têm acesso garantido às Umeis, como prevê o Plano Nacional de Educação (PNE), de 2014.
“É algo já garantido e uma conquista de todos. Agora, uma definição de quando a universalização vai acontecer nas demais idades, ainda não é possível prever”, afirmou a gerente de Coordenação de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação, Mayrce Freitas. A prefeitura pretende inaugurar mais cinco unidades neste ano.
A previsão estipulada pelo PNE é que o ensino seja universal para 50% das crianças com até 3 anos na escola até 2020.