Jornal Valor Econômico: “Indicadores sugerem atividade abaixo do esperado até 2017”

18/11/2016 | Economia

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Valor Econômico - 14/11/2016

Depois dos maus resultados da indústria e do comércio no terceiro trimestre, alguns indicadores de outubro reforçaram a avaliação de que a economia brasileira vai encolher também nos últimos três meses do ano. Nesse cenário difícil, marcado pela queda na produção de veículos e de cimento no mês passado, bancos e consultorias revisam para baixo as estimativas para a variação do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016 e 2017.

Para este ano, as projeções de que o PIB cairia 3% dão lugar a previsões de um recuo na casa de 3,5%. No caso do ano que vem, as estimativas estão mais próximas de 1%, embora haja quem preveja um PIB estável, caso do Banco Fator. Para complicar, a vitória de Donald Trump nas eleições americanas elevou a incerteza no mercado internacional, pressionando moedas emergentes como o real, o que pode levar o Banco Central (BC) a ser mais cauteloso no ciclo de queda dos juros, iniciado no mês passado.

No terceiro trimestre, a produção industrial caiu 1,1% em relação ao segundo, feito o ajuste sazonal, enquanto as vendas no varejo ampliado recuaram 2,7%. Os números indicam que o investimento levará mais tempo para decolar, além de evidenciar a fraqueza do consumo. "Houve uma decepção grande no terceiro trimestre", resume o economista-chefe da JGP Gestão de Recursos, Fernando Rocha, que chegou a estimar uma alta de 0,2% sobre os três meses anteriores.

Hoje, ele acredita que o PIB tenha recuado 1% no terceiro trimestre, uma queda mais forte da atividade do que a registrada na primeira metade do ano. No primeiro trimestre, o PIB encolheu 0,4%, caindo 0,6% no segundo. Para os últimos três meses do ano, Rocha prevê nova baixa, de 0,2%.

Rocha diz que a recuperação terá que ser liderada pelo investimento. O consumo não fará o papel de tirar a economia da recessão, num quadro de forte piora do mercado de trabalho. Ele nota que há uma destruição de mais de 100 mil empregos formais por mês, na série com ajuste sazonal, e a massa salarial está em queda. Tampouco virá do setor público o impulso à retomada, uma vez que o governo deverá se empenhar em ajustar as contas públicas.

No segundo trimestre, a produção de capital cresceu com força - 6,8% em relação ao primeiro -, sugerindo um quadro mais favorável para o investimento, o que não se manteve. No terceiro, caiu 2,6%.

Para o economista Igor Velecico, do Bradesco, a formação bruta de capital fixo (medida do que se investe em máquinas e equipamentos, construção civil e pesquisa) caiu entre 1,5% e 2% no terceiro trimestre, sendo um dos principais motivos para o recuo previsto de 0,9% para o PIB no período. Já o consumo das famílias, que responde por mais de 60% do PIB, deve ter se contraído 0,8%.

Um dos motivos que explicam a demora da retomada é o descompasso entre a avaliação sobre a situação atual e as expectativas de empresas e consumidores, diz Velecico. Os indicadores de confiança subiram neste ano por causa da melhora em relação às perspectivas para o futuro, mas as condições correntes seguem fracas (veja reportagem Sem endosso da realidade, economia se descola da expectativa). Companhias e famílias estão endividadas e o crédito está travado.

Indicadores de outubro sugerem resultados desanimadores também para o fim do ano. Velecico cita a queda da produção de cimento, de 2,3% em relação a setembro, e a de 12,2% na fabricação de caminhões, segundo dados com ajuste sazonal do Bradesco. A expectativa do banco é de que o PIB caia algo como 0,3% no quarto trimestre em relação ao terceiro - antes, a aposta era num recuo de 0,1%.

Com o desempenho decepcionante no segundo semestre, Rocha passou a projetar retração de 3,5% para o PIB neste ano. Ainda não é uma queda tão forte quanto os 4% que ele estimava no começo do ano, quando Dilma Rousseff ainda era a presidente, mas é pior que o recuo de 3% previsto no momento mais otimista de 2016, na esteira do aumento da confiança de empresários e consumidores. Velecico vê uma retração do PIB de 3,6% neste ano.

O Banco Fibra também rebaixou as suas projeções para a variação do PIB em 2016 e 2017. Para este ano, o economista-chefe da instituição, Cristiano Oliveira, reduziu a estimativa de uma queda de 3% para um tombo de 3,7%, com a expectativa de novos recuos da atividade no terceiro trimestre (recuo de 1%) o e no quarto (-0,2%).

Com esses resultados, a herança estatística (o "carry over') de 2016 para 2017 será pior, caindo de -0,2% para -0,8%. Isso significa que, se o PIB do ano que vem não crescer nada em relação ao nível do fim deste ano, a economia encolherá 0,8% em 2017.

O "efeito Trump" sobre a curva de juros no Brasil ajuda a explicar parte da redução da estimativa de crescimento do PIB no primeiro trimestre do ano que vem de 0,9% para 0,5%, segundo Oliveira. A expectativa de que haja uma expansão fiscal mais forte no governo de Donald Trump elevou as taxas dos títulos do Tesouro americano. Para muitos investidores, os cortes de impostos e o aumento dos gastos em infraestrutura desejados por Trump devem levar a mais crescimento e mais inflação, o que implica juros mais altos nos EUA, pressionando as moedas emergentes. Por aqui, o real se desvalorizou e a curva de juros subiu. Oliveira também revisou a projeção para o primeiro trimestre de 2017 por causa da própria fraqueza da economia brasileira, num cenário de crédito travado e endividamento de consumidores e empresas.

Também houve certa interrupção da melhora dos indicadores de confiança, diz Oliveira. Para ele, parte dos empresários acreditava num corte da Selic de 0,5 ponto percentual na reunião de outubro e em mais 0,5 ponto neste mês. No entanto, o BC fez uma redução de apenas 0,25 ponto no mês passado, para 14% ao ano, e a perspectiva é de que promova outro corte da mesma magnitude em novembro, num momento em que há incertezas no mercado e o câmbio está mais pressionado.

Rocha e Velecico, que trabalhavam com crescimento de 1,5% para 2017, projetam agora 1%, mas consideram que até mesmo esse número pode ser difícil de ser atingido. Para Rocha, é importante reduzir os juros, num cenário em que a atividade está muito deprimida e as expectativas de inflação para 2017 já caíram abaixo de 5% - a meta perseguida pelo BC é de 4,5%.

Para o economista-chefe do Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, as perspectivas para a atividade são difíceis. Ele manteve a previsão de uma queda do PIB de 3,3% neste ano, mas revisou a estimativa para 2017 de uma alta de 0,5% para estabilidade. O problema, para ele, é o consumo, que seguirá em queda também no ano que vem, num ambiente em que o desemprego poderá atingir 13% em junho - no terceiro trimestre deste ano, ficou em 11,8%.