Luís Nassif: “A capacidade da economia de brigar com os fatos”

22/07/2015 | Economia

Luis Nassif

Jornal GGN – 22/07/2015

A formação acadêmica, o conhecimento teórico é uma ferramenta que só tem utilidade se empregados para entender os fenômenos analisados.

Em geral, há uma enorme dificuldade do economista ideológico em submeter a teoria ao crivo do senhor fato. Mesmo que os fatos não se comportem conforme previsto na teoria, os economistas de menor visão apegam-se à teoria julgando que em algum ponto qualquer do futuro a verdade aparecerá e a teoria se imporá sobre os fatos rebeldes.

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É o que está por trás da fé cega do Banco Central no uso desmedido da Selic contra a inflação, e do Ministério da Fazenda em insistir em um ajuste recessivo que está promovendo uma queda do nível de atividade e da arrecadação mais que proporcional ao ajuste fiscal pretendido.

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A ideia é que quanto mais rápido o ajuste (isto é, quanto mais agressivas as medidas tomadas), mais rapidamente a inflação convergirá para o centro da meta, mais rapidamente os empresários acreditarão na higidez fiscal e voltarão a investir.

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O Ministro Guido Mantega se perdeu devido à fé cega no poder da fé e da palavra. A cada frustração do PIB armava uma coletiva na qual anunciava mais incentivos fiscais e garantia que dali para frente a economia iria crescer.

Esse mesmo procedimento está sendo adotado pelo Ministro Joaquim Levy. As previsões de queda do PIB já batem em 2%, a receita cai em nível muito mais agudo. Ninguém no mercado espera a manutenção das metas de superávit fiscal. Os formadores de opinião se dariam por satisfeitos em perceber uma trajetória segura – realista e sem fantasias – rumo ao equilíbrio da relação divida/PIB em um ponto qualquer do futuro.

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A maneira como o BC está aplicando o sistema de metas inflacionarias futuramente será um caso a ser estudado nas boas escolas de economia internacionais.

Tem-se hoje em dia uma economia exangue. Desde fins do ano passado, havia sinais nítidos de trajetória descendente. No último trimestre, uma queda brutal da arrecadação já demonstrava a inversão do ciclo.

Os grandes estrategistas econômicos, ao lado do conhecimento teórico, acumulam experiência prática e capacidade de, a partir dos dados e do clima econômico, intuir a trajetória da economia. Não importa o nível em que ela está hoje, mas o nível em que poderá estar daqui a alguns meses, mantidas as mesmas condições de temperatura.

É por isso que cada Banco Central norte-americano, além das séries estatísticas, mantém contato permanente com as principais empresas do setor real da economia, para captar as tendências. Não se trata se ciência exata, mas da capacidade de intuir o todo, somando o conhecimento estatístico e a sensibilidade para o mundo real.

Por aqui, aplica-se uma tecnicalidade de quinta categoria. Só depois que a vítima está estrebuchando na calçada e que se consegue avaliar o tamanho do tombo.

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Daqui a um ano se terá uma economia mais pobre, uma relação dívida/PIB maior (por conta dos juros), nenhum investimento por conta da capacidade ociosa da economia e da taxa de retorno dos títulos públicos.

Daí, quando parar de cair, haverá uma comemoração pela recuperação, sem se avaliar o quanto se deixou de ganhar no período.