Marcos Coimbra: “As eleições municipais abriram um novo Febeapá”

18/11/2016 | Política

A despeito dos analistas midiáticos, pleitos como o recente nunca influenciaram as eleições presidenciais. E Lula é sempre o favorito

ELEIÇOES_6_1.png

Carta Capital – 18/11/206

Em cartaz há 60 anos, o Festival de Besteiras que Assola o País (o Febeapá do saudoso Stanislaw Ponte Preta), costuma chegar ao ápice logo após uma eleição municipal. Este ano só está sendo diferente no volume de bobagens.    

É difícil explicar por que a imaginação política não consegue compreender o que são (e o que não são) as eleições municipais. Afinal, desde o fim da ditadura de 1964, foi a nona vez que as fizemos, uma contagem mais que suficiente para que tivessem perdido o mistério. 

Não é, contudo, o que acontece. Quando terminam, o mais comum é vermos, na fala de políticos, no discurso acadêmico e, especialmente, na mídia, a mesma velha cantilena, de interpretações equivocadas e projeções despropositadas a respeito de seu impacto.

Alguém consegue adivinhar quando saiu na Folha de S.Paulo uma análise intitulada “PSDB avança e PT reduz presença nos grandes centros”? Erra quem responder que foi nos últimos dias: essa matéria específica é de novembro de 2004, véspera de uma década de vitórias petistas em eleições presidenciais.

Note-se que o jornalista não mentiu. De fato, o PT havia ido mal e o PSDB bem naquelas eleições, em grande parte porque José Serra fora eleito prefeito e Marta Suplicy perdera a reeleição em São Paulo. Mas aquele resultado em nada antecipava o que aconteceria depois, quando, nos três pleitos presidenciais subsequentes, o eleitorado brasileiro escolheu um petista para presidente da República. 

É cansativo repetir, mas parece necessário: resultados de eleições municipais em nada determinam quem vencerá a eleição presidencial seguinte. Um partido que “cresce” ou “diminui” no número de prefeitos (ou de votos obtidos) não se encaminha para eleger o presidente ou está fadado ao fracasso. Não foi assim com Fernando Collor (que venceu com um prefeito em seu partido), com Fernando Henrique Cardoso, com Lula e com Dilma. Não será assim com quem vencer em 2018.

Outro capítulo do Febeapá de agora são os exercícios de quem quer decifrar o “recado das urnas” e tecer grandes conclusões a respeito da sociedade brasileira. Desde o último domingo, a mídia está inundada por essas análises, em geral batendo na tecla da “novidade”. O fato, no entanto, é que, com exceção do sucesso de Alexandre Kalil em Belo Horizonte, nada de efetivamente diferente aconteceu este ano nas eleições para prefeito das capitais.

A vitória de João Doria em São Paulo quer dizer, basicamente, a mesma coisa que disseram as de Jânio Quadros, Paulo Maluf, Celso Pitta, José Serra e Gilberto Kassab. Ela apenas expressa a regra de eleições locais conservadoras na cidade, vez por outra intercalada por exceções, como Luiza Erundina e Fernando Haddad. Doria é o normal e o normal é o que mais frequentemente acontece. Sua performance nada tem de novidade. 

No Rio de Janeiro, considerar Marcelo Crivella como “novo” é pura desinformação. O prefeito eleito disputou todas as eleições majoritárias na cidade desde 2002 (salvo a de 2012), foi ministro de Estado e integra um grupo político organizado há décadas. E ver sua eleição como parte de uma “onda conservadora” é um equívoco. Ninguém discute que o seja, mas, desde quando vencem, para prefeito do Rio de Janeiro, políticos progressistas? O primeiro e último foi Roberto Saturnino Braga, eleito em 1985. Ou alguém acha que Cesar Maia, Luiz Paulo Conde e Eduardo Paes são de esquerda? 

O grande prêmio do Febeapá de 2016 vai, todavia, para os “analistas” do futuro de Lula. Com destaque para a meia dúzia de colunistas da mídia corporativa que enxergaram seu “fim” nos resultados das eleições deste ano. Lula é o político brasileiro mais bem avaliado na atualidade, com mais do dobro de menções positivas que qualquer opositor. É o “melhor presidente” que o Brasil já teve para a larga maioria. Quase dois terços da população consideram que seu governo lhes trouxe ganhos reais. 

Nas intenções espontâneas de voto, Lula tem, sozinho, mais que a soma de quaisquer outros nomes, lidera nos cenários estimulados de primeiro turno e não perde no segundo turno para ninguém. Seus índices cresceram nos últimos meses, de acordo com todas as pesquisas disponíveis, apesar da campanha que sofre. Como opção para a eleição de 2018, está léguas à frente dos demais nomes da oposição ao atual governo, que não tem nenhum. 

Mas há analistas que decretam seu “fim”. Seria bom, para as esquerdas, que alguém prestasse atenção no que apregoam, pois diminuiriam os esforços para impedir que o ex-presidente seja candidato. O problema é que, na direita séria, ninguém acredita nessas bobagens.

*Artigo publicado originalmente na edição 927 de CartaCapital, com o título "Febeapá municipal"