Plano Joaquim Levy impõe enormes sacrifícios à população e a forte recessão deteriorou ainda mais as contas do governo
A economia brasileira, é verdade, enfrentava dificuldades crescentes no final do primeiro mandato da presidenta Dilma Roussef. A inflação estava bastante pressionada; o déficit público (receitas menos despesas) ficou em 7% em 2014, com forte repercussão na dívida bruta; o balanço de pagamentos estava negativo em mais de 4% do PIB; e a economia estava quase parando.
Em função deste quadro instável, Dilma optou por um receituário econômico ortodoxo, com a entrega do Ministério da Fazenda a Joaquim Levy vinculado ao mercado financeiro. Numa tempestade quase perfeita, a economia brasileira caminha para uma recessão de -3%, a pior dos últimos 22 anos. O Plano Levy, ao invés de um remédio virou um veneno que aprofundou a crise econômica, com enormes sacrifícios para a população e ainda não entregou o prometido: a estabilização das contas do governo e a manutenção do chamado “grau de investimento” para o Brasil.
Os desafios da presidenta Dilma são enormes. O Brasil, como os demais emergentes, sofre com a desaceleração da economia da China, que é o destino de grande parte de nossas commodities, como o minério de ferro, café, soja, etc. Assim, mesmo em um cenário mais favorável do câmbio não se pode esperar uma contribuição decisiva do setor externo na recuperação da economia brasileira. A Operação Lava Jato retira pelo menos 1% do crescimento do PIB brasileiro e atinge duramente dois segmentos que poderiam encabeçar a recuperação interna de nossa economia: o setor de petróleo e gás (Petrobras) e o setor de logística e infraestrutura (grandes construtoras). O Brasil vive ainda uma estiagem severa, que impacta fortemente no preço da energia elétrica e da água, agravando muito a inflação.
Foi neste cenário mais que preocupante que a política econômica de Joaquim Levy e Alexandre Tombini teve um efeito devastador. Os juros tiveram uma overdose e chegaram a 14,5% ao ano, o que indica juros reais acima da inflação de 9%, na tentativa de reduzir, em um único ano, inflação de 9,5% para 4,5%. Já o ajuste fiscal tem realizado um violento corte de despesas do governo e retornando com alguns impostos. Estas duas medidas, empurraram a economia para uma violenta recessão, o desemprego cresceu muito, a renda diminuiu e o consumo das famílias desabou. As medidas também não ajudaram o ajuste fiscal, já que as receitas desabaram e as despesas com juros explodiram e, com isso, o déficit público se ampliou e a dívida pública bruta disparou.
A crise econômica alimenta a crise política e é realimentada por ela. Dilma rompeu com seus compromissos de campanha, e teve a sua popularidade reduzida a 7% apenas. A Operação Lava Jato criou uma situação de rebelião na base aliada e lideranças importantes de partidos, para fugirem do foco das investigações, se juntam à oposição na conspiração contra o governo Dilma. O presidencialismo de coalizão brasileiro, baseado no sistema de lista aberta, despolitiza o voto proporcional, fragmenta a representação parlamentar e dificulta que o partido da presidenta, com menos de 20% dos parlamentares, tenha a governabilidade assegurada, em particular em momentos de crises agudas como a que estamos vivendo.
A permanência de Levy vai apenas adiar os problemas
É evidente que não é uma decisão fácil da presidenta Dilma demitir o ministro Joaquim Levy e romper com seu plano recessivo. Mas manter Levy, é bom provável, vai apenas adiar os problemas políticos e econômicos do governo.
Luís Nassif afirma que a equipe econômica é como uma orquestra de diversos solistas sem um maestro: “A economia precisa necessariamente de ser vista de forma sistêmica, assim como o organismo humano. Um nefrologista não pode tratar da doença do seu paciente se não souber analisar as implicações do tratamento sobre seu organismo”. (...) “O equilíbrio econômico é assim, depende da combinação correta de um conjunto de políticas: a tributária-fiscal, a monetária, a cambial, a salarial, todas interdependentes. Dependendo das circunstâncias, prioriza-se alguma dessas políticas e as demais se ajeitam em torno da prioridade maior”.(...) “Cabe ao Ministro-maestro compatibilizar as diversas políticas, afim de se obter o equilíbrio. O grande nó do governo Dilma é que não existe esse maestro”.
Nassif continua: “Os analistas do Banco Central foram acometidos do mesmo fenômeno que afeta procuradores, delegados ou repórteres atrás do seu furo: não importa a busca da verdade (no caso da economia, do equilíbrio econômico) mas garantir o seu furo, a preponderância da política monetária. O pensamento dominante no Copom (Comitê de Política Monetária) é que se deve colocar a inflação na meta (4,5% em 2016) independentemente do custo fiscal e dos efeitos sobre o nível de atividade econômica. Selic em 14,5%, em meio a um quadro recessivo que está apontando para uma queda do PIB próxima a 3%, cria a seguinte situação: a) a receita fiscal vai para as profundezas, comprometendo qualquer veleidade de equilíbrio fiscal; b) a relação dívida bruta/PIB explode; c) qualquer tentativa de reduzir o déficit, via cortes, aprofundará a recessão e colocará mais lenha na fogueira política. O que o BC têm a oferecer a perder de vista é a redução do custo de rolagem da dívida quando a inflação cair. Os mortos que ficarem pelo caminho – dentro os quais o próprio governo Dilma – agradecerão”.
Luís Nassif conclui: “O problema é quem está acima, o maestro responsável pela coordenação de todos os instrumentos econômicos. O Ministro da Fazenda Joaquim Levy não rege. Nem ousa discutir com o BC, como se a política monetária não tivesse nenhuma relevância para as metas fiscais. E como Levy espera o início da recuperação da economia em alguns meses? Pela fé. Se o empresário acreditar que o governo conseguirá equilibrar as contas fiscais, imediatamente voltará a investir. No primeiro semestre do ano, o número de consultas ao BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) caiu 47% devido às incertezas quanto à demanda futura. Ou seja, ao empresário não basta acreditar que o ajuste fiscal será alcançado: o que o move é a convicção de que a demanda será recuperada”.
Antônio Lassance, em uma crítica ácida, afirma que Joaquim Levy não apenas representa o mercado financeiro, mas a mediocridade da política econômica do mercado financeiro. Disse ele: “Um ministro da Fazenda não pode ser apenas um secretário do Tesouro de luxo, obsessivamente preocupado com a variável gasto público, sem atenção ao conjunto da obra. De um ministro da Fazenda se espera mais do que fazer as contas para cortar despesas. Se espera alguém capaz de liderar o debate sobre os rumos econômicos do país e manejar os instrumentos da política macroeconômica para criar ou aperfeiçoar incentivos que, mesmo em momentos de crise, mantenham os agentes produtivos interessados no crescimento”.(...) “Levy não apenas representa bem o mercado (financeiro). Representa, melhor ainda, a mediocridade da política econômica ditada pelo mercado financeiro, cujos horizontes de melhora são sempre postergados para prazos cada vez mais longos, quando muitos já terão perdido o emprego, os bancos terão lucrado como nunca, e o Brasil terá ficado para trás”.(...) “Se ele continuará ou não no posto de ministro da Fazenda, por muito ou pouco tempo, é difícil dizer. Mas que o País precisa urgentemente de um ministro da Fazenda de verdade, que seja mais que um secretário do Tesouro, isso é líquido e certo”.