Rodrigo Freitas: “Duplicar e construir avenidas, trincheiras e viadutos piora o trânsito. Saída é transporte público”

09/06/2016 | Nossas cidades

Muita gente vai se lembrar da inauguração do Viaduto Presidente Itamar Franco, na avenida Tereza Cristina, entre os bairros Prado e Carlos Prates, em Belo Horizonte. A obra foi anunciada como uma das meninas dos olhos da Prefeitura de Belo Horizonte. Era referência em beleza arquitetônica e prometia dar fim aos congestionamentos nos horários de pico na região por onde passa o pontilhão da linha férrea (onde está a única linha do metrô de BH), o que gerava um estreitamento da pista.

Inaugurado em maio de 2013, o grandioso viaduto viu um congestionamento logo no primeiro dia de trânsito correndo por suas pistas. A iniciativa que prometia melhorar a vida de motoristas e passageiros que tentavam chegar ao Centro de Belo Horizonte era natimorta. Estava longe de cobrir as expectativas que se criaram em torno de uma “solução mágica” para os problemas de mobilidade que o cidadão metropolitano enfrenta nos dias de hoje.

Não se sabe se por desinformação ou má fé mesmo, a Prefeitura de Belo Horizonte – assim como muitas outras Brasil afora – ignorou as tendências de urbanismo que dominam as rodas de conversas dos arquitetos de visão mais progressista. Hoje, existe um imenso questionamento sobre a real valia de obras grandiosas que causam impacto real apenas ao serem vistas de cima, nas fotos publicitárias que exaltam os grandes feitos da engenharia. Afinal, quem está ali embaixo continua refém da (i)mobilidade urbana nossa de cada dia. Volto ao exemplo do belo Viaduto Presidente Itamar Franco, em BH, para reforçar a percepção de que essas grandes obras fazem bem apenas à fama de “tocador de obras” que alguns prefeitos gostam de ter.

Mas engana-se quem pensa que essa é uma discussão moderna. Embora tenha ganhado fôlego apenas recentemente no Brasil, em 1962, o economista americano Anthony Downs já havia explicado a Lei Fundamental do Congestionamento. Com base em dados coletados em seus estudos, ele demonstra que a demanda de espaço pelos carros particulares é elástica e que é inoperante aumentar a oferta. “O aumento da capacidade das vias incentiva a ocupação das mesmas que, por sua vez, acaba toda ou grande parte da capacidade adicionada”, diz o estudo de Downs. Na prática, significa dizer que quanto mais pistas se constroem, mais carros as ocuparão e mais congestionamentos tomarão conta das ruas das grandes cidades.

Belo Horizonte aprendeu de forma dolorosa que essa máxima de Anthony Downs é verdadeira. Durante a Copa de 2014, a cidade se viu às voltas com o desabamento do viaduto recém-construído que passava sobre a avenida Pedro I, no bairro Planalto. O “desastre” causou a morte de duas pessoas. A obra tinha o objetivo de melhorar a fluidez do tráfego, e a Prefeitura de Belo Horizonte queria reconstrui-la em forma de trincheira. A comunidade local peitou a administração municipal e não deixou que nenhuma estrutura fosse erguida naquele trecho. O resultado? O trânsito continua como sempre foi na região.

Estudos mostram ainda que a demolição de viadutos, trincheiras e pontes – que costumam também enfeiar as cidades – não geraram problemas como se esperava. As pessoas se ajustam, e o trânsito segue sua rotina normalmente após as demolições. O artigo “Morte e Vida das Rodovias Urbanas”, do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP, na sigla em inglês) traz exemplos de cidades como São Francisco e Portland, nos Estados Unidos, e Seul, na Coreia do Sul, que demoliram elevados, viadutos e vias expressas e os substituíram por parques e áreas para o transporte coletivo, bicicletas e pedestres.

Aí entra a outra questão: seria mais barato investir em plataformas de transporte coletivo de diferentes modais interligados entre si do que sair por aí construindo viadutos, trincheiras e grandes avenidas. Não basta colorir o espaço urbano com o cinza-escurto do asfalto. É preciso privilegiar as políticas que levem em conta o conceito comunitário em detrimento da cultura individualista das metrópoles.

Em Belo Horizonte, a própria BHTrans, em um estudo feito recentemente, admitiu que construir avenidas, viadutos e trincheiras não resolve o problema. Mas a pergunta é: será que os gestores públicos estão preparados para isso? Será que topariam deixar de lado a fama de “tocadores de obras” por “pensadores de metrópole”?

Apenas para que você note a importância do transporte coletivo, veja as fotos abaixo. Elas falam por si só.

Como 200 pessoas podem ser inserir no espaço urbano

De carro:

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De ônibus:

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De metrô:

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*Rodrigo Freitas é jornalista e assessor de comunicação da deputada estadual Marília Campos. Foi repórter especial e editor adjunto de Cidades do jornal "O Tempo" e repórter e apresentador das rádios Itatiaia, CBN e BandNews FM.